sábado, 28 de abril de 2012

CURRÍCULO OCULTO

Currículo Oculto - 1


Esse verbete versa sobre o conceito de currículo oculto, contextualizando-o como parte das Teorias Críticas sobre Currículo, tendo como aporte teórico o autor Tomaz Tadeu da Silva. O currículo como objeto de estudo surge nos Estados Unidos, nos anos 20, com o livro The Curricullum de Bobbitt (1918) e consolida-se com Ralph Tyler (1949), com o paradigma técnico-linear, responsável por influenciar outros países, como o Brasil, com essa concepção tecnicista de escola e de currículo. Entretanto, na década de 60 – marcada pelos movimentos de contracultura, liberação sexual, lutas contra a ditadura no Brasil, feminismo – se estabelecem as Teorias Críticas do currículo, destacando-se autores como Paulo Freire, Althusser, Bourdieu e Passeron, Baudelot e Establet, Basil Bernstein, Michael Young, Bowles e Gintis, Michael Apple e Henry Giroux. É neste contexto que nasce no campo conservador da sociologia funcionalista com Philip Jackson e Robert Dreeben – década de 60, o conceito de currículo oculto. Mesmo tendo surgido no campo tradicional funcionalista da Sociologia, o conceito de currículo oculto exerceu grande influência em todas as perspectivas críticas. Contudo, há uma distinção entre a utilização funcionalista e a crítica. Para os funcionalistas o currículo oculto é desejável porque ensina comportamentos necessários para o bom funcionamento da sociedade. Para os críticos é indesejável porque distorce os genuínos objetivos da educação, na medida em que moldam as crianças e jovens para se adaptarem às injustiças estruturais da sociedade capitalista, portanto, é dominador. Silva (2004) aponta que os autores críticos desenvolvem a Teoria Crítica como inversão da Teoria Tradicional, apresentando-a como a teoria da desconfiança, do questionamento e da transformação radical, produzindo conceitos que permitam compreender o que o currículo faz. Por essa perspectiva, a escola é vista como aparelho ideológico do Estado (Althusser), a qual transmite a ideologia por meio dos rituais, gestos e práticas corporais, mais do que por manifestações verbais.
Bowles e Gintis na análise que fazem sobre a escola norte-americana, concluem que as relações sociais na escola ensinam as crianças e jovens as normas e atitudes para se adaptarem às exigências do trabalho capitalista, numa correspondência entre a escola e trabalho, ensinando a subordinação às classes subalternas. Para Althusser as aprendizagens da obediência, da pontualidade são aprendidas pelos conteúdos, já para Bowles e Gintis, isso é aprendido nas relações sociais do local de trabalho, refletidas nas relações sociais da escola. Em Bourdieu e Passeron afasta-se a análise marxista de base econômica e materialista. Os dois autores analisam a escola sob o conceito de local de reprodução cultural, ou seja, a reprodução social está ligada ao processo de reprodução cultural. O currículo nesta perspectiva age como forma de exclusão, uma vez que, ele transmite e se constitui da cultura dominante. Segundo Silva, o conceito de currículo oculto se aproxima muito das definições de Althusser, Bowles e Gintis.
O autor define que "o currículo oculto é constituído por todos aqueles aspectos do ambientes escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explícito, contribuem, de forma implícita, para aprendizagens sociais relevantes". (SILVA, 2004, p. 78). Aponta ainda, que as características estruturais da sala de aula e da situação de ensino, mais do que o seu conteúdo explícito, é que ensinam certas coisas: relações de autoridade, organização espacial, distribuição do tempo, padrões de recompensa e castigo etc. Na visão crítica, no currículo oculto se aprendem atitudes, comportamentos, valores e orientações que permitem um ajuste às estruturas e funcionamento da sociedade capitalista. Ele ensina o conformismo, a obediência e o individualismo. Mais recentemente, defende-se que por meio do currículo oculto aprendem-se valores relacionados à nacionalidade, gênero, sexualidade e raça (como ser homem ou mulher; como ser hetero ou homossexual; identificação com uma determinada raça ou etnia). Segundo Silva os elementos no ambiente escolar que contribuem para essas aprendizagens são: as relações entre professores e alunos, administração e alunos, administração e professores, alunos e alunos; a organização do espaço escolar: rigidamente ou frouxamente organizado; o ensino do tempo: pontualidade, controle, divisão em unidades discretas, um tempo para cada tarefa; os rituais, regras, regulamentos, normas etc; as categorias como: mais e menos capazes, meninos e meninas etc. Nesta perspectiva crítica, a noção de currículo oculto implica a possibilidade de termos um momento de iluminação e lucidez para "detectá-lo" e, portanto, desocultá-lo. Atuando assim em favor de valores "desejáveis".
Segundo Silva, a consciência é que vai permitir as mudanças, pois "tornar-se consciente do currículo oculto significa, de alguma forma, desarmá-lo" (Silva, 2004, p.80). O conceito de currículo oculto contribuiu para a análise sociológica na perspectiva crítica. Contudo, o desgaste e a banalização desse conceito fizeram com que ele caísse no desuso na análise educacional. A noção de currículo oculto pode ser de grande valia para professoras e professores no cotidiano da sala de aula, pois permite compreender os processos sociais que produziram nossas subjetividades e "o quê" e "como" estamos produzindo em nossos alunos e alunas por meio do currículo oficial e oculto.
Esse conceito possibilita pensar em como, nós, professoras e professores caímos constantemente nas "armadilhas ideológicas ", sem nosso conhecimento consciente, sendo capturados por processos "invisíveis". O conceito permite ver além do espelho e perceber a força da "invisibilidade" do que é tido como "natural" na escola.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CORTELLA, Mário Sérgio. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e políticos. São Paulo: Cortez, 1998.
SILVA, Tomaz Tadeu. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2 ª ed, 7ª impressão. Belo Horizonte: Autêntica, 2004.


Eliana Marques Ribeiro Cruz

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